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    A elite paulista, ao longo do século XIX, abandonou as regiões centrais de São Paulo devido aos problemas de abastecimento de alimentos na cidade. Essa região era conhecida como “colina histórica”, e tinha uma forma triangular, formada pelas ruas Direita, São Bento e do Rosário. Ao se mudarem para as áreas mais altas, em que se localizavam os cordões de chácaras (MOTA, 2007, p. 73), o centro urbano começou a ser transformado em uma típica cidade industrial. Inúmeros bairros proletários, localizados próximo às várzeas dos rios Tietê e Tamanduateí, surgem incentivados pela estrada de ferro e pela chegada maciça de imigrantes (FERREIRA, 2015, p. 10).

    O bairro central, portanto, apresentou duas vertentes urbanas distintas: por um lado os bairros da zona oeste, sudoeste e sul estabelecidos pela aristocracia; e de outro lado, delimitado pela várzea do Rio Tamanduateí, o Brás, ampliando-se até as proximidades da Estação Mooca, a leste. Essa extensão alcançava os bairros Belenzinho e Pari, por meio da Avenida Intendência, atual Celso Garcia, a qual também dava acesso às altas colinas (MOTA, 2007, p. 89).

    O número de moradores era menor em relação ao cortiço e as vilas de aluguéis e, geralmente, era acessível a funcionários especializados. Outras vantagens eram a redução do aluguel em troca de salários inferiores, a absorção de outros membros da família como empregados na fábrica e uma vinculação da relação casa-emprego que desencorajava a procura de melhores salários, pois implicava na obrigatória saída da habitação (MOTA, 2007, p. 104-105).

    A construção desse tipo de vila seguia as instruções do Código de Postura de 1886 para as “casas higiênicas”, em que uma residência se destinava a uma família, com lavanderia e sanitário privativos (MORANGUEIRA, 2006, p. 52). Denominada também de vila-cidadela, de acordo com Rolnik (apud MORANGUEIRA 2006, p. 41), introduz equipamentos urbanos como escolas, lojas, igrejas, salões de dança, salas de leitura e de artesanato para a formação do caráter desses trabalhadores. Em São Paulo, esse tipo de princípio foi empregado na Vila Maria Zélia, no Belenzinho, e a Vila Clarck, na Mooca. 

    É nesse período que as habitações localizadas nas áreas centrais foram ocupadas pela classe proletária. Em formato de cortiços, possuíam péssimas condições de habitabilidade, abrigando famílias de dez ou mais membros em cada um dos cômodos em que se dividiam essas antigas casas de chácaras, antes pertencentes à elite, ou seja, as instalações sanitárias e a lavanderia eram comuns a todos os moradores (SOUZA, 2011, p.40).  

    A vila para trabalhadores também surge como solução à questão habitacional dessa classe e aos problemas de cunho socioeconômico dos industrialistas e empreendedores, devido a inserção das novas políticas governamentais e sanitaristas. Estudos, como o de Edwin Chadwick — reformador social inglês conhecido pela sua liderança nas reformas de saneamento urbano e saúde pública na Inglaterra — afirmavam que essas vilas surgiram da necessidade de aliviar conflitos gerados pelos assalariados, as quais foram incentivadas pelo poder público como uma nova forma de morar, sendo mais adequada a esses proletários, “higiênica e barata” (FERREIRA, 2017, p. 92). 

    Esse   tipo  de  vila, segundo Morangueira (2006, p.  43) originou na  Europa durante a revolução industrial, por consequência das aceleradas modificações que as cidades estavam passando, em uma tentativa de evitar conflitos entre patrão e operário. 

     Os principais influenciadores foram Robert Owen, em New Lanark, nos Estados Unidos (Figura 04), Richardson, em Hygea, na Inglaterra, e o Falanstério de Fourier (Figura 05) e o Familistério de Godin (Figura 06), ambos na França. 

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    A lei municipal 498, de 14 de dezembro de 1900, afirmava que essas vilas deveriam ser estabelecidas fora da aglomeração urbana e seus empreendedores deveriam realizar obras de infraestrutura como rede de esgoto, luz e água. A maioria, constituída para a classe operária, foi instalada pelas várzeas dos rios Tietê e Tamanduateí, seguindo as linhas férreas, formando, assim, os bairros Brás, Pari, Mooca, Ipiranga, Bom Retiro, Barra Funda e Água Branca (MOTA, 2007, p. 101).

    A classe média também chegou a morar em vilas, principalmente nos anos de 1920 e 1930, estabelecida em bairros como Pinheiros, Cerqueira César, Paraíso, Aclimação e Saúde, por exemplo. A qualidade das habitações era bem superior e, atualmente são bem disputadas para compra e locação. 

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    As vilas industriais brasileiras, portanto, seguiram estas teorias utópicas urbanas da Europa do século XIX, para novas políticas de caráter disciplinador, a fim de se restabelecer a ordem e desfortalecer as ideias antissociais. Então, havia um controle dentro e fora da fábrica, que fornecia segurança aos operários, por meio da inserção de uma guarda privada que controlava conflitos e brigas, e também o lazer. Dessa forma, os serviços necessários para garantir as condições de vida do trabalhador e sua família eram fornecidas pela fábrica (MORANGUEIRA, 2007, p. 42).

    Há duas categorias para essas vilas que se distinguem em relação ao seu empreendimento e a espacialização dos ambientes. As suas diferenças são:

•    Vila de aluguéis: surgiram com diversas modalidades de tipologias para abrigar as classes média e baixa e vistas como uma oportunidade de uma nova fonte de rendimento patrocinado por investidores privados por meio de cobranças de aluguéis de suas casas. Foram essenciais tanto para a reprodução da força de trabalho de baixo custo, como na replicação de moradias populares em São Paulo. 

Delimitação dos primeiros barros operários, aristocráticos e cortiços  (Mapa de São Paulo de 1895).  Fonte: Adaptado da Prefeitura de São Paulo.

    As mais populares foram o cortiço-corredor, o cortiço-casa de cômodos e habitações geminadas. Ocorreu um surto na construção civil que aumentou os negócios de locação, uma renda mensal e benefícios de isenções fiscais, denominado de produção rentista (BONDUKI, 1998, p. 43-46).

    Em seu livro, Origens da Habitação Social no Brasil, Bonduki descreve esse tipo de habitação como pequenas vilas para locação, que podiam compor-se de poucos cômodos privativos (sala, cozinha e quarto), com lavanderia e latrina coletivas (BONDUKI, 1998, p. 53-54).

•    Vilas de industriais: esse tipo de vila possuía a função de além de fornecer emprego e moradia, higienizar as moradias dos pobres conforme o Código de Posturas do Município de São Paulo de 1886. O principal e único investidor dessas habitações é o próprio dono da fábrica, pois este conseguia controlar seus funcionários dia e noite, acreditando que eles se tornariam mais obedientes e submissos. 

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